VI Encontro TyA Brasil – Da droga à palavra
O campo das toxicomanias continua a nos fazer questão. Em um mundo que avança decididamente para a consolidação do objeto no zênite social, a toxicomania evidencia o paradigma do sujeito contemporâneo e seu modo de gozo adicto. “O modelo geral da vida cotidiana no século XXI é a adição. O “Um” goza todo só com sua droga, e toda atividade pode tornar-se droga: o esporte, o sexo, o trabalho, o smartphone, o Facebook”.[1]
Essa prevalência do Um sozinho em nossa época contrasta radicalmente com o estatuto do Outro, tesouro dos significantes, que ancorou o sintoma neurótico por excelência. A civilização engendrou as condições ideais para que o gozo do Um fosse franqueado em larga escala e o objeto que melhor condensa essa premissa, não poderia ser outro que não o tóxico.
A droga na cultura revela um sintoma social apontando para uma crise com o saber a partir da função tóxica. Nunca se produziu tanta informação e conteúdo, sobretudo a partir do advento das redes sociais. No entanto, há muito pouca produção de saber.
“O que o tóxico procura, é a evacuação da significação e, portanto, uma maneira de manter-se por fora do dizer. Fora do discurso, na positividade da repetição”.[2]
O silêncio da pulsão prescinde da palavra e, portanto, do saber. O acesso direto ao gozo em sua versão mais autista diz respeito ao autoerotismo e menos ao Outro sexuado.
Inversamente à operação toxicômana, a palavra opera frente ao gozo opaco da pulsão em uma função de mediação e, com a experiência analítica, um saber é produzido.
Como fazer para introduzir o amor pelas palavras diante do rechaço da posição toxicômana?
Como o analista pode operar na oferta de um lugar não segregativo que permita ao sujeito não assentar-se na identificação toxicômana que a cultura oferta? Se na toxicomania o objeto mais de gozar está aderido a um produto da indústria, “o analista deveria ser um dealer da droga da palavra”.[3]
Como para todo falasser a partida se dá com o gozo do Um, esse que itera e cuja raíz é a adição, o lugar do analista no jogo com o sujeito toxicômano seria o de fornecer a palavra, na tentativa de promover o amor ao inconsciente. “O amor é o que poderia fazer a mediação entre os um-sozinho”.[4]
Onde há identificação bruta ao “sou toxicômano”, o efeito dealer do analista poderia oferecer o tóxico da palavra, jogando com o gozo da fala ali onde o mais de gozar era o produto/droga, abrindo uma hiância diante das formas fixas e silenciadas de gozo, das parcerias corpo/química onde esse cada vez mais se coloca em risco em uma relação de exclusividade em detrimento à palavra?
Da clínica com as toxicomanias, pode-se formalizar uma política que se distingue dos demais tratamentos ofertados ao campo das dependências químicas?
É o que tentaremos interrogar através das diversas experiências que pretendemos recolher e que podem nos ensinar sobre a oferta da psicanálise à clínica das toxicomanias no VI Encontro da rede TyA Brasil. Esperamos a contribuição de todos!